sexta-feira, 8 de junho de 2012

Indicações reais e fictícias para a cesariana

A cesariana sem necessidade é uma epidemia no Brasil. As gestantes sofrem com a  falta de informação e sobra de inocência em acreditar em tudo o que o médico diz sem ao menos pesquisar ou procurar uma segunda opinião. A conveniência de alguns médicos, infelizmente a maioria deles, e a falta de preparo para acompanhar um parto normal colaboram com este quadro.
O número de mulheres que se submetem a cesárea para o nascimento dos seus filhos é muito grande no nosso país e bem além do que seria aceitável pela OMS (Organização Mundial da Saúde).
A médica obstetra Melania Amorim mantém uma lista sempre atualizada dessas indicações. 
Se prepara que a parte de indicações falsas é ENORME!
Segue o texto e a lista:



A presente lista de indicações de cesariana circula na Internet desde 2005, quando eu publiquei a primeira versão em uma comunidade do Orkut ("Cesárea? Não, obrigada!"), e desde então tem sido amplamente divulgada, crescendo lamentavelmente a cada dia, porque estou sempre me deparando com gestantes querendo esclarecimentos ou mulheres que contam suas próprias histórias ou histórias de amigas. 

Recentemente, Ana Cristina Duarte, obstetriz e amiga, fez alguns acréscimos e organizou a lista em ordem alfabética, motivo pelo qual lhe dou os créditos da presente versão. É de domínio público, usem à vontade, mas preferentemente remetendo à fonte, ou seja, Amorim & Duarte (2012), com link para esta página da Web.

Não temos a pretensão de cobrir todas as possíveis indicações de cesariana, apenas começamos a elencar sobretudo as "não indicações" mais frequentes.

Para uma leitura mais aprofundada e baseada em evidências, eu recomendo a série de artigos que publicamos na revista Femina, "Indicações de Cesariana Baseadas em Evidências", em três partes:

Parte 1 Indicações de Cesariana Baseadas em Evidências - Parte 1 

Parte 2 Indicações de Cesariana Baseadas em Evidências - Parte 2

Parte 3 Condições frequentemente associadas à Cesariana sem respaldo científico

Segue a lista (em constante atualização):



INDICAÇÕES REAIS E FICTÍCIAS PARA A CESÁREA

Algumas indicações de cesariana

REAIS

1) Prolapso de cordão – com dilatação não completa;

2) Descolamento prematuro da placenta com feto vivo – fora do período expulsivo;

3) Placenta prévia parcial ou total (total ou centro-parcial);

4) Apresentação córmica (situação transversa) - durante o trabalho de parto (antes pode ser tentada a versão);

5) Ruptura de vasa praevia;

6) Herpes genital com lesão ativa no momento em que se inicia o trabalho de parto.


PODEM ACONTECER, PORÉM FREQUENTEMENTE SÃO DIAGNOSTICADAS DE FORMA EQUIVOCADA

1) Desproporção cefalopélvica (o diagnóstico só é possível intraparto, através de partograma e não pode ser antecipado durante a gravidez);

2) Sofrimento fetal agudo (o termo mais correto atualmente é "freqüência cardíaca fetal não-tranqüilizadora", exatamente para evitar diagnósticos equivocados baseados tão-somente em padrões anômalos de freqüência cardíaca fetal);

3) Parada de progressão que não resolve com as medidas habituais (correção da hipoatividade uterina, amniotomia), ultrapassando a linha de ação do partograma.

SITUAÇÕES ESPECIAIS EM QUE A CONDUTA DEVE SER INDIVIDUALIZADA, CONSIDERANDO-SE AS PECULIARIDADES DE CADA CASO E AS EXPECTATIVAS DA GESTANTE, APÓS INFORMAÇÃO

1) Apresentação pélvica (recomenda-se a versão cefálica externa com 37 semanas mas se não for bem sucedida, discutir riscos e benefícios com as gestantes: o parto pélvico só deve ser tentado com equipe experiente e se for essa a decisão da gestante);

2) Duas ou mais cesáreas anteriores (o risco potencial de uma ruptura uterina – variando de 0,5% - 1% - deve ser pesado contra os riscos de se repetir a cesariana, que variam desde lesão vesical até hemorragia, infecção e maior chance de histerectomia);

3) hiv/aids (cesariana eletiva indicada se HIV + com contagem de CD4 baixa ou desconhecida e/ou carga viral acima de 1.000 cópias ou desconhecida); em franco trabalho de parto e na presença de ruptura de membranas, individualizar casos.


Algumas desculpas utilizadas pelos profissionais para realizar uma DESNEcesárea (em ordem alfabética)

1.   Abdominoplastia prévia
2.   Aceleração dos batimentos fetais
3.   Adolescência
4.   Ameaça de chuva/temporal na cidade
5.   Anemia falciforme
6.   Anemia ferropriva
7.   Anencefalia
8.   Artéria umbilical única
9.   Asma
10. Assalto ou outras formas de violência (gestante ou familiar foi vítima de assalto, então o bebê pode ficar estressado)
11. Bacia "muito estreita" 
12. Baixa estatura materna 
13. Baixo ganho ponderal materno/mãe de baixo peso 
14. Bebê alto, não encaixado antes do início do trabalho de parto
15. Bebê profundamente encaixado 
16. Bebê que não encaixa antes do trabalho de parto 
17. Bebê "grande demais" (macrossomia fetal só é diagnosticada se o peso é maior ou igual que 4kg e não indica cesariana, salvo nos casos de diabetes materno com estimativa de peso fetal maior que 4,5kg. Não se justifica ultrassonografia a termo em gestantes de baixo risco para avaliação do peso fetal). 
18. Bebê "pequeno demais" 
19. Bolsa rota (o limite de horas é variável, para vários obstetras basta NÃO estar em trabalho de parto quando a bolsa rompe) 
20. Calcificação da sínfise púbica (alegando-se que ocorreria em TODAS as mulheres com mais de 35 anos, impedindo o parto normal)
21. Candidíase
22. Cardiopatia (o melhor parto para a maioria das cardiopatas é o vaginal) 
23. Cesárea anterior 
24. Chlamydia, ureaplasma e mycoplasma 
25. Circular de cordão, uma, duas ou três “voltas” (campeoníssima – essa conta com a cumplicidade dos ultrassonografistas e o diagnóstico do número de voltas é absolutamente nebuloso) 
26. Cirurgia gastrointestinal prévia 
27. Colestase gravídica 
28. Coleta de sangue do cordão umbilical para congelamento e preservação de células-tronco
29. Colo grosso, colo posterior, colo duro, colo alto e (paradoxalmente) colo curto
30. Colostomia 
31. Conização prévia do colo uterino 
32. Constipação (prisão de ventre) 
33. Cálculo renal 
34. Data provável do parto (DPP) próximo a feriados prolongados e datas festivas (incluindo aniversário do obstetra) 
35. Datas significativas como 11/11/11 ou 12/12/12 (ainda bem que a partir de 2013 precisaremos esperar o próximo século) 
36. Diabetes mellitus clínico ou gestacional 
37. Diagnóstico de desproporção cefalopélvica sem sequer a gestante ter entrado em trabalho de parto e antes da dilatação de 8 a 10 cm
38. Dorso à direita, dorso posterior, ou dorso em qualquer outro lugar
39. Edema de membros inferiores/edema generalizado 
40. Eletrocauterização prévia do colo uterino 
41. Endometriose em qualquer grau e localização 
42. Epilepsia e uso de qualquer droga antiepiléptica
43. Escoliose 
44. Espondilite anquilosante – Qualquer espondiloartropatia
45. Estreptococo do Grupo B (EGB) no rastreamento com cultura anovaginal entre 35-37 semanas
46. Exérese prévia de pólipos intestinais por colonoscopia 
47. Falta de dilatação antes do trabalho de parto
48. Feto com "unhas compridas" 
49. Feto morto 
50. Fibromialgia 
51. Fratura de cóccix em algum momento da vida 
52. Gastroplastia prévia (parece que, em relação ao peso materno, se correr o bicho pega, se ficar o bicho come) 
53. Gestação gemelar com os dois conceptos, ou o primeiro, em apresentação cefálica 
54. Gravidez não desejada 
55. Grumos no líquido amniótico 
56. HPV (só há indicação de cesárea se há grandes condilomas obstruindo o canal de parto) 
57. Hemorroidas 
58. Hepatite B e hepatite C 
59. Hiperprolactinemia 
60. Hipertireoidismo 
61. Hipotireoidismo 
62. História de cesárea na família 
63. História de câncer de mama ou câncer de mama na gravidez 
64. História de depressão pós-parto 
65. História de natimorto ou óbito neonatal em gravidez anterior 
66. História de trombose venosa profunda 
67. História familiar de fibrose cística do pâncreas
68. Idade materna "avançada" (limites bastante variáveis, pelo que tenho observado, mas em geral refere-se às mulheres com mais de 35 anos) 
69. Incisura nas artérias uterinas (pesquisada inutilmente, uma vez que não se deve realizar dopplervelocimetria em uma gravidez normal) 
70. Infecção urinária 
71. Inseminação artificial, FIV, qualquer procedimento de fertilização assistida (pela ideia de que bebês "superdesejados" teriam melhor prognóstico com a cesárea) - motivo pelo qual esses bebês aqui no Brasil muito raramente nascem de parto normal 
72. Insuficiência istmocervical (paradoxalmente, mulheres que têm partos muito fáceis são submetidas a cesarianas eletivas com 37 semanas SEM retirada dos pontos da circlagem) 
73. Laparotomia prévia 
74. Líquido amniótico em excesso
75. Magreza da mãe
76. Malformação cardíaca fetal 
77. Mecônio no líquido amniótico (só indica cesariana se houver associação com padrões anômalos de frequência cardíaca fetal, sugerindo sofrimento fetal)
78. Mioma uterino (exceto se funcionar como tumor prévio) 
79. Miscigenação racial (pelo "elevado risco" de desproporção céfalo-pélvica) 
80. Neoplasia intraepitelial cervical (NIC) 
81. Obesidade materna
82. Obstetra (famoso) não sai de casa à noite devido aos riscos da violência urbana 
83. Paciente “não tem perfil para parto normal”
84. Paciente “não ajuda para o parto normal” (momento vidente ON: “no fundo ela quer cesárea”)
85. Parto "prolongado" ou período expulsivo "prolongado" (também os limites são muito imprecisos, dependendo da pressa do obstetra). O diagnóstico deve se apoiar no partograma. O próprio ACOG só reconhece período expulsivo prolongado mais de duas horas em primíparas e uma hora em multíparas sem analgesia ou mais de três horas em primíparas e duas horas em multíparas com analgesia. Na curva de Zhang o percentil 95 é de 3,6 horas para primíparas e 2,8 horas para multíparas) 
86. “Passou do tempo” (diagnóstico bastante impreciso que envolve aparentemente qualquer idade gestacional a partir de 39 semanas) 
87. Perineoplastia anterior
88. Pé nas costelas
89. Pé torto congênito
90. Placenta grau III ou II ou I ou qualquer outra classificação
91. Plaquetas baixas não oclusivas do colo do útero
92. Possível falta de vaga em maternidade para um parto normal, caso a gestante não marque a cesárea
93. Pouco líquido no exame ultrassonográfico (sem indicação no final da gravidez em gestantes normais)
94. Praticar musculação ou ser atleta 
95. Pressão alta 
96. Pressão baixa 
97. Problemas oftalmológicos, incluindo miopia, grande miopia e descolamento da retina 
98. Profissão professora
99. Prolapso de valva mitral 
100.  Qualquer malformação fetal incompatível com a vida 
101.  Qualquer procedimento cirúrgico durante a gravidez 
102.  Reação vasovagal
103.  Sedentarismo 
104.  Septo uterino/cirurgia prévia para ressecção de septo por via       histeroscópica
105.  Ser bailarina 
106.  Suspeita ecográfica de mecônio no líquido amniótico 
107.  Síndrome de Down e qualquer outra cromossomopatia 
108.  Síndrome de Ovários Policísticos (SOP)
109.  Tabagismo 
110.  Trabalho de parto prematuro 
111. Tricomoníase
112.  Trombofilias 
113. Trombose venosa profunda
114.  Varizes uterinas 
115.  Uso de antidepressivos ou antipsicóticos 
116. Uso de aspirina
117.  Uso de heparina de baixo peso molecular ou de heparina não fracionada 
118.  Útero bicorno
119. Vaginose bacteriana
120.  Varizes na vulva e/ou vagina

Até mais!

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